quarta-feira, 31 de maio de 2017

O que quer a Rede Globo?


A delação dos donos da JBS precipitou o declínio do governo Temer. Poucos na bolsa de apostas de Brasília acreditam na possibilidade de mantê-lo até 2018, apesar dos esforços desesperados de salvação. Temer perdeu as condições políticas para governar o País. Pesam contra ele não apenas denúncias, mas provas, vistas e escutadas amplamente.

O peemedebista aposta na tática de arrastar a crise, ao rechaçar a opção de renúncia e criar um falso ambiente de normalidade. Não tem outra saída. Mesmo se decidir renunciar, não poderá fazê-lo sem a busca de um acordo que salve seu pescoço. Caso contrário, corre o risco de sair do Palácio do Planalto direto para a prisão, dado que perderia o foro especial.

Convenhamos, não há surpresa no conteúdo da denúncia. Que o governo Temer depende do silêncio de Eduardo Cunha até mesmo a crédula Velhinha de Taubaté desconfiava. Que Cunha não daria o silêncio em troca de nada é quase uma obviedade. Portanto, embora gravíssimos, os fatos não geraram perplexidade nacional.

O que surpreendeu  foi a postura da Rede Globo no episódio, partindo para o ataque decidido e rápido contra Temer, exigindo sua queda. Essa guinada criou uma divisão na mídia e no campo que apoiou o golpe. Folha de S.Paulo e O Estado de S. Paulo não seguiram a toada dos Marinho e relativizaram o teor das denúncias.

É preciso compreender o que está em jogo na decisão política da Globo neste momento e em sua aliança com setores do Ministério Público. Existem hipóteses.

Há quem sugira que a Globo e os setores político-econômicos que ela vocaliza tenham chegado a uma avaliação de que Temer não conseguiria entregar as reformas. Improvável, pois o governo caminhava para aprovar a reforma trabalhista no Senado e, possivelmente, a da Previdência na Câmara, após algumas concessões e um jogo pesado de compra de apoio.

Outra possibilidade na mesa é o fator Lula. Sua força eleitoral cresceu muito nos últimos meses, em paralelo à perda de apoio social de Temer. O interrogatório de Curitiba, que visava constrangê-lo, teve efeito inverso. Lula saiu fortalecido de lá, ampliando a visão geral de falta de provas para condená-lo. Sergio Moro e a Globo, nesse sentido, ficaram num impasse. Agora, com o nível de repercussão das acusações contra Temer e, em especial, contra Aécio Neves, cria-se um clima mais favorável à condenação e, quiçá, à prisão de Lula. É evidente que enfraquecem a percepção de seletividade e perseguição política contra ele. E, como confessou um delegado da Lava Jato, o que vale é o timing.

Esse fator, embora relevante, não explica por si só que a aliança Globo/Ministério Público derrube o governo Temer e coloque em risco a aprovação das reformas. Creio ser possível supor uma aposta mais estratégica, pensando na hegemonia política de longo prazo.

O sistema político da Nova República está em ruínas. Crivado por denúncias, desmoralizado, esse modelo perdeu a capacidade de levar à coesão a sociedade brasileira. Perdeu hegemonia, embora ainda represente o poder de fato. Cabe uma analogia com a crise da ditadura sob o comando do general João Figueiredo. A ditadura ainda tinha o comando, mas havia perdido completamente a capacidade de criar maioria social. Em situações como essa, sempre há o risco de soluções por baixo, expressas na revolta popular contra um regime sem representatividade. A casa-grande tem verdadeiro pavor de alternativas como esta e, historicamente, antecipou-se para construir acordos de transição seguros e conservadores.

Foi assim no fim da ditadura, pode ser assim agora. Não é de hoje que a Globo aposta na narrativa do Judiciário como salvador nacional. Criaram heróis do combate à corrupção, que podem representar a opção a um sistema que perdeu a credibilidade. Uma forma de “limpar” o Estado brasileiro, manter a agenda dominante e recobrar a hegemonia social pode ser com protagonismo do Judiciário. Não por acaso constrói-se a figura de Cármen Lúcia como possível saída em caso de eleições indiretas. Seria uma nova Operação Golbery, com juízes e procuradores à frente.

Embora somente uma hipótese, é preciso muita atenção em relação aos interesses dessa coalizão. Se a crise da Nova República for canalizada nessa direção, isso pode significar o fechamento democrático, com institucionalização de medidas de exceção aplicadas. Não se deve descartar inclusive que se apropriem da bandeira de uma nova Constituinte.

De todo modo, a desconfiança ante os interesses dessa coalizão não pode legitimar o envolvimento de setores da esquerda em arranjos de salvação. Nem para a manutenção de Temer, tampouco por eleições indiretas. Quaisquer que sejam os nomes, devem ser prontamente rechaçados pela ilegitimidade do processo.

A única saída possível é engrossar o caldo pela saída de Temer e por eleições diretas, construindo uma frente ampla e fortalecendo as mobilizações populares. A rua é o melhor desinfetante contra soluções antidemocráticas.
Professor Edgar Bom Jardim - PE

Muita emoção no momento da chegada do corpo de Assunção na EREM Rita Maria

Professores de várias  escolas de Orobó e cidades da região (Bom Jardim, Casinhas, Umbuzeiro, Limoeiro) se fizeram presentes no momento em  que o corpo de Maria Assunção da Silva Coutinho, ex-gestora escolar chegou para o velório na EREM Rita Maria. O sepultamento será amanhã, quinta-feira,  às 9 horas na comunidade do Varjão. Muitos estudantes, professores, representantes da GRE - Limoeiro, diretores de escolas, religiosos e pais de alunos prestaram suas homenagens com muitas palmas e  orações em clima de muita comoção. O ex-prefeito José Francisco da Silva, afirmou que a educação oroboense sofreu uma grande perda. 
Professor Edgar Bom Jardim - PE

Brasil supera apenas Venezuela e Mongólia em ranking de competitividade


Fábrica em BrasíliaDireito de imagemAGÊNCIA BRASIL
Image captionRanking de competitividade avalia eficiência empresarial e infraestrutura

O Brasil está próximo da lanterna da competitividade global, aponta um relatório divulgado nesta quarta-feira pelo instituto de pós-educação suíço IMD em parceria com a Fundação Dom Cabral.
Segundo o levantamento anual, apenas Venezuela e Mongólia estão em situação pior do que o Brasil. O país está na 61ª posição dentre as 63 economias avaliadas. De acordo com o diretor do estudo, o professor Arturo Bris, a má performance se deve à crise política no país.
No topo do ranking estão Hong Kong e Suíça, já haviam garantido o primeiro e segundo lugar na edição passada, seguidos por Cingapura e Estados Unidos, respectivamente, que trocaram de posição em relação à análise anterior.
Em 2016 o Brasil figurava na 57ª posição, mas caiu quatro pontos porque seus indicadores políticos e econômicos pioraram.
O ranking, que é publicado desde 1989, avalia o perfil dos países com base em quatro pilares: performance econômica, eficiência de governo, eficiência empresarial e infraestrutura.
Por meio de uma estimativa baseada em estatísticas compiladas sobre essas categorias, um país é comparado com o outro. Os dados utilizados para a edição atual são referentes ao período de janeiro a abril deste ano.
Na performance econômica, o Brasil recuou de 55 para 59, na eficiência do governo piorou de 61 para 62, na eficiência empresarial foi de 51 para 49 e na infraestrutura, caiu de 46 para 51.

Presidente Michel TemerDireito de imagemREUTERS
Image captionDiretor do estudo diz que solucionar corrupção deve preceder reformas propostas por Temer

A intenção do estudo é servir de referência para a criação de políticas públicas que gerem prosperidade para os indivíduos do país. No caso do Brasil, o país está falhando porque a crise de desgoverno não estão levando em consideração o interesse da sociedade, explica Bris.
"O Brasil é o caso clássico em que o setor público é um obstáculo à competitividade do país", avaliou Bris em entrevista à BBC Brasil.

Corrupção

Apesar de defender a necessidade de reformas no país, o professor avalia que não é sustentável nem eficiente tentar se levar adiante a pauta sem resolver a questão da corrupção primeiramente.
"A percepção do mercado (sobre o Brasil) é muito negativa, o país está entre os dez piores para se fazer negócios. O setor privado não acredita no governo. Eles não podem tomar a tarefa de investir e criar empregos para deixar o país mais competitivo. Isso não vai funcionar", pondera.
O estudo avalia que os objetivos brasileiros devem ser: acelerar a retomada econômica, modernizar e facilitar as leis, aprovar reformas-chave e reconquistar a confiança internacional. Para isso, é necessário desenvolver e implementar uma estratégia de competitividade digital, além de aumentar a eficiência e qualidade do sistema educacional.
"Competitividade é sobre criar empregos, estimular a prosperidade de uma nação", resume Bris.

Fábrica em BrasíliaDireito de imagemAGÊNCIA BRASIL
Image captionBrasil está entre os dez piores para fazer negócios, diz diretor de estudo

De acordo com a perspectiva do estudo da IMD, a maior vulnerabilidade do Brasil é a falta de visão de longo prazo, como políticas de melhora da qualidade da educação pública e de inserção na economia digital. Esses aspectos do investimento público são avaliados sob o tema infraestrutura e recuaram também. Educação caiu de 51 para 55 e infraestrutura científica retrocedeu de 36 para 41.
Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgados na quarta-feira apontam que 13, 6% da população economicamente ativa está ociosa. Há uma piora em relação ao trimestre anterior - mais de 1,1 milhão de brasileiros perderam o emprego nos últimos três meses.
O indicador doméstico reforça a avaliação da IMD de que a situação está se deteriorando. O total de brasileiros desempregados já chega a 14 milhões. O número de pessoas sem trabalho é pouco menos que duas vezes a população da Suíça (que tem cerca de 8,3 milhões de habitantes).
"Primeiramente há que se combater a corrupção e se começar pelas escolas. O país precisa retomar a reforma do sistema educacional. Isso não é para o curto prazo, isso é para o longo. Essa é definitivamente uma das principais vulnerabilidades do país", afirma o professor.
"O investimento em educação primária tem sido muito ineficiente, sem conquistas. É necessária uma reforma maciça."
O instituto também lançou um ranking que mede a competitividade digital dos países. Nesse novo índice, o Brasil foi avaliado na 55ª posição, caindo um ponto em relação a 2016.

Joesley BatistaDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionJBS, dos irmãos Batista, foi beneficiada por política de "campeões nacionais"

Políticas de campeões nacionais

A política de subsidiar companhias brasileiras por meio de empréstimos do BNDES, banco estatal de fomento, foi um dos marcos dos anos do PT no poder.
A chamada promoção de "campeões nacionais" favoreceu iniciativas como as empresas do grupo X, de Eike Batista, e a JBS, de proteína animal. Ambos os grupos estão envolvidos agora nas investigações da operação Lava Jato.
Bris acredita que esse tipo de estratégia pode ter resultados adversos, tudo dependendo de como ela é gerida, pois o objetivo final para ganho de competitividade precisa ser a criação de empregos.
"Veja o caso da Espanha, meu país, por exemplo. Lá os campeões nacionais são provedores de serviços que operam globalmente. Bancos como o Santander, ou empresas de construção, ou petroleiras como a Repsol. Ter gerado esses campeões nacionais não ajudou a reduzir o desemprego na Espanha, porque essas são empresas que investem e crescem muito no exterior, mas não empregam tantos espanhóis", avalia.
"Por outro lado, veja a Suíça. Ela promove campeões nacionais como a Nestlé, Novartis ou ABB. Essas empresas são manufatureiras, produzem muito no país e geram uma grande quantidade de empregos. Isso ocorre não apenas porque elas empregam diretamente, mas também porque elas possuem empresas satélites que proveem serviços para elas", pondera.
"Se o governo do Brasil vai criar empresas que exportam muito e fazem apenas algumas poucas pessoas ficarem ricas, então a política de campeões nacionais não vai funcionar."
Professor Edgar Bom Jardim - PE

A incrível história do brasileiro chamado de louco pelos vizinhos por plantar a própria floresta


Antonio VicenteDireito de imagemGIBBY ZOBEL
Image captionPrestes a completar 84 anos, Antonio Vicente orgulha-se de ter plantado a própria floresta

Antonio Vicente era chamado de louco pelos vizinhos.
Afinal, quem compraria um pedaço de terra a 200 km de São Paulo para começar a plantar árvores?
"Quando comecei a plantar, as pessoas me diziam: 'você não viverá para comer as frutas, porque essas árvores vão demorar 20 anos para crescer'", conta Vicente ao repórter Gibby Zobel, do programa Outlook, do Serviço Mundial da BBC.
"Eu respondia: 'Vou plantar essas sementes, porque alguém plantou as que estou comendo agora. Vou plantá-las para que outros possam comê-las."
Vicente, prestes a completar 84 anos, comprou seu terreno em 1973, uma época na qual o governo militar oferecia facilidades de crédito para investimentos em tecnologia agrícola, com o objetivo de impulsionar a agricultura.
Mas sua ideia era exatamente a oposta.
Criado em uma família numerosa de agricultores, ele via com preocupação como a expansão dos campos destruía as fauna e flora locais, e como a falta de árvores afetava os recursos hídricos.
"Quando era criança, os agricultores cortavam as árvores para criar pastagens e pelo carvão. A água secou e nunca voltou", explica.
"Pensei comigo: 'a água é o bem mais valioso, ninguém fabrica água e a população não para de crescer. O que vai acontecer? Ficaremos sem água."
As florestas são fundamentais para a preservação da água porque absorvem e retém esta matéria-prima em suas raízes. Além disso, evitam a erosão do solo.

Antonio VicenteDireito de imagemGIBBY ZOBEL
Image captionA primeira árvore que Vicente plantou foi uma castanheira

Recuperação da floresta

Quando tinha 14 anos, Vicente saiu do campo e passou a trabalhar como ferreiro na cidade.
Com o dinheiro da venda de seu negócio, pôde comprar 30 hectares em uma região de planície perto de São Francisco Xavier, distrito de 5 mil habitantes que faz parte de São José dos Campos, no interior de São Paulo.
"A vida na cidade não era fácil", lembra ele.
"Acabei tendo de viver debaixo de uma árvore porque não tinha dinheiro para o aluguel. Tomava banho no rio e vivia debaixo da árvore, cercado de raposas e ratos. Juntei muitas folhas e fiz uma cama, onde dormi", diz Vicente.
"Mas nunca passei fome. Comia sanduíches de banana no café da manhã, almoço e jantar", acrescenta.
Após retornar ao campo, começou a plantar, uma por uma, cada uma das árvores que hoje formam a floresta úmida tropical com cerca de 50 mil unidades.

'Nadando contra a corrente'

Vicente nadava contra a corrente: durante os últimos 30 anos, em que se dedicou a reflorestar sua propriedade, cerca de 183 mil hectares de mata atlântica no Estado de São Paulo foram desflorestados para dar lugar à agricultura.
Segundo a Fundação Mata Atlântica SOS e o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), a mata atlântica cobria originalmente 69% do Estado de São Paulo.
Hoje, a proporção caiu para 14%.

AmazôniaDireito de imagemSPL
Image captionDepois de ter diminuído, ritmo de desmatamento voltou a crescer no Brasil

E, ainda que esteja distante do pico de 2004, quando 27 mil hectares foram destruídos, o ritmo de desmatamento voltou a aumentar.
Entre agosto de 2015 e julho de 2016, por exemplo, foram destruídos 8 mil hectares de floresta - uma alta de 29% em relação ao ano anterior e o nível mais elevado desde 2008, segundo dados do Inpe.

Animais e água

Um quadro pendurado na parede da casa de Vicente serve de lembrança das mudanças que ele conseguiu com seu próprio esforço.
"Em 1973, não havia nada aqui, como você pode ver. Tudo era pastagem. Minha casa é a mais bonita de toda essa região, mas hoje não se pode tirar uma foto desse ângulo porque as árvores a encobrem, porque estão muito grandes", brinca Vicente.
Com o replantio, muitos animais reapareceram.
"Há tucanos, todo tipo de aves, pacas, esquilos, lagartos, gambás e, inclusive, javalis", enumera.
"Temos também uma onça pequena e uma jaguatirica, que come todas as galinhas", ri.
O mais importante, contudo, é que os cursos de água também voltaram a brotar.
Quando Vicente comprou o terreno, só havia uma fonte. Agora, há cerca de 20.
Fonte:BBC
Professor Edgar Bom Jardim - PE

Educação oroboense perde Maria Assunção

Orobó e as demais cidades da GRE Vale do Capibaribe, lamentam a notícia da  morte da professora Maria Assunção, gestora por muitos anos da EREM Rita Maria da Conceição, no município de Orobó, na manhã desta quarta (31) de maio. A divulgação da morte de Assunção repercute nas redes sociais. Gestora competente, muito dedicada. O corpo será velado na Escola Rita Maria, a partir das 11 horas. O sepultamento acontecerá  amanhã às 9 horas.
Foto: Facebook.
Professor Edgar Bom Jardim - PE

terça-feira, 30 de maio de 2017

A avó que esperou 60 anos para revelar passado de prostituição e como foi salva por amor de sua vida



Francisca Carmona GarcíaDireito de imagemJASMINE GARSD/PRI
Image captionFrancisca Carmona García nunca tinha contado seu segredo, até agora

Há dois meses, uma amiga quis falar comigo. Queria conversar sobre sua avó Frances, de 85 anos. A mulher tinha uma história que precisava contar a alguém. Por isso fui à sua casa.
A mulher é baixa e magra, com cabelo branco e olhos castanhos que parecem sorrir, mesmo quando está séria. Fala com um forte sotaque do bairro de Queens, em Nova York (Estados Unidos), soando como se estivesse mastigando as palavras antes de pronunciá-las.
Mas os segredos têm uma linguagem própria. E ela insiste que apenas contará esta história em sua língua materna, o espanhol.
Começa dizendo que nasceu com o nome de Francisca Carmona García, no Estado de Jalisco, no oeste do México. Quando fala de Jalisco, seus olhos se iluminam.
"Os homens são bonitos lá", diz. "Você está corando", eu digo. "Sim", responde com uma risada. "Eu sei".
Perguntei qual era sua memória favorita da infância e ela diz "a vontade de sair de lá". A família Carmona era pobre.


Retrato de Francisca Carmona GarcíaDireito de imagemJASMINE GARSD/PRI
Image captionA vida de Francisca mudou inesperadamente quando ela tinha 16 anos

"Comíamos sementes e tortilhas, com alguma pimenta, e sabia muito bem porque estávamos com fome", conta.
Ela me contou que sua irmã mais nova morreu de fome. Quando Frances tinha 14 anos, partiu de sua casa para ir à cidade de Guadalajara. Conseguiu um trabalho como empregada doméstica e começou a enviar dinheiro para casa.
Mas o dinheiro continuava escasso e Francisca tinha sonhos maiores. "O Norte", diz, ainda com um pouco de medo na voz. Ela se referia aos Estados Unidos.

A 'oportunidade'

Era a década de 1950. A década da prosperidade e expansão cultural dos Estados Unidos. Foi quando nasceu o rock'n'roll, quando Marilyn Monroe cantava que os diamantes eram "seus melhores amigos".
John Wayne pilotava aviões na tela grande, e Marlon Brando estava no filme Um Bonde Chamado Desejo.
Francisca conseguiu sua grande oportunidade quando tinha 16 anos. Uma mulher mais velha se aproximou dela e disse: "Estamos procurando garçonetes bem na fronteira com o Texas. Um pequeno povoado chamado Villa Acuña. Num restaurante chamado La Perla".


Marilyn MonroeDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionMarilyn Monroe cantou "Os diamantes são os melhores amigos da menina" no filme "Os homens preferem as loiras" (1953)

Francisca fez as malas e partiu, rumo a seu novo trabalho. Era uma viagem de um dia. Quando finalmente chegou à cidade, ela se deu conta de que não havia restaurante. Nem mesmo ruas, ela disse. La Perla era uma casa no meio do nada. Era um bordel.
"Você tem que fazer o que tem que fazer", lembra-se, resignada. Nunca tinha imaginado que isto lhe aconteceria. E não tinha escolha. "Eu era o ganha-pão da minha família", explica.
Tudo isto aconteceu quando ainda era adolescente. "Eles nos deram um quarto, nos disseram para ficarmos bonitas e que fôssemos ao salão porque estava cheio de soldados americanos", disse.
O bordel servia exclusivamente a militares americanos, que chegavam da fronteira do Texas. Os mexicanos não colocavam o pé no La Perla, mas a polícia mexicana protegia o lugar e vigiava as meninas.
Francisca comenta que médicos faziam visitas periódicas no local.

Com sorte

É estranho, ouvir esta doce avó me contar a história de como foi traficada enquanto insistia que terminasse um prato gigante de pamonha de milho que preparou para mim.


Bar da Ciudad Juárez, no estado de ChihuahaDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionA cidades fronteiriças mexicanas são lugares conhecidos pelo turismo sexual

Mas nada disto é incomum. As cidades fronteiriças mexicanas historicamente serviram como lugares de vício e exploração. O turismo sexual é um negócio lucrativo até hoje.
As autoridades informam que entre 2011 e 2012 mais de nove mil mulheres desapareceram no México. E isto são apenas os casos denunciados.
Mas Francisca não conta sua história como outras sobreviventes de tráfico sexual com quem falei. Ela fala do quão sortuda ela foi.
Sua amiga, que foi levada para outra cidade, foi assassinada. Francisca fala da madame gentil que a permitia guardar parte do dinheiro que ganhava. De homens importantes em uniforme, que eram cavalheirescos.
Saio de sua casa um pouco perplexa. Mas seu tom muda na próxima vez que falamos, quando me convida para comer.

Por que agora?

Enquanto serve uma sopa de rabada no meu prato, Frances me diz: "Sabe, esta é uma grande vergonha na minha vida, quero que entenda que estava desesperada".
"É uma coisa feia", lamenta. "Ter relações com um homem que você não quer, você apenas fecha os olhos e deixa acontecer. É falso. Faz por necessidade, não por desejo. Não entende nada de amor. Não sabe beijar com paixão".
Pergunto se tem nojo. Ela faz uma pausa e responde: "Sim, comigo mesma".
Então pergunto por que ela está me contando este segredo. Por que agora? Por que revelar aquilo?


Mulher com máscaraDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionAutoridades informam que entre 2011 e 2012 mais de nove mil mulheres desapareceram em todo o México

"Não sei", responde, e logo vacila. "Não sei por quê. Acredito que havia algo aqui", explica, enquanto esfrega seu peito esquerdo. "Algo dentro de mim".
Carmona diz saber o quanto queria deixar aquele lugar. Ela assegura que sempre disse a si mesma "tenho que me casar com um americano".

Realmente apaixonados?

Um dia chegou um cliente, que era alto e bonito, um sargento da Força Aérea dos Estados Unidos. Ele se chamava William.
"Era tão elegante", lembra Frances. "Levava uma camisa azul e uma gravata. Media quase 1,80 m".
Naquela noite, deram um passeio. A lua estava bonita.


Estação de ônibus de Manhattan, Nova YorkDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionFrancisca chegou pela estação de ônibus de Manhattan, que funciona até hoje

"Ele se apaixonou por mim e disse 'quero que saia daqui'", conta Francisca.
Eles realmente se apaixonaram? Será que uma jovem confinada em um bordel, desesperada para sair de lá, pode realmente amar o homem que pode resgatá-la? Um cliente? Toda vez que pergunto, ela responde o mesmo.
"Me apaixonei e amei aquele homem", garante.
Eles se casaram, e William a trouxe para Nova York. Foram de ônibus. Era 1952. Chegaram à estação da Autoridade Portuária, a agitada e congestionada estação central de ônibus de Manhattan, que funciona até hoje.
Foi lá que nos encontramos, num sábado de manhã.

60 anos depois

Ela estava ansiosa para me levar ao bairro de Queens e me apresentar a seus amigos. Depois de aproximadamente uma hora no metrô, chegamos. Caminhamos por uma barulhenta avenida e por tranquilas ruas suburbanas.
Embora hoje esteja cheio de gente que fala espanhol e ouve reggaetón, a avó Frances foi a primeira latina a viver ali. Sua nova família a aconselhou que não falasse em espanhol com seus filhos. Naquele momento, a região era, acima de tudo, um bairro italiano.


Pessoas caminham no Queens, Nova YorkDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionNo bairro do Queens, em Nova York, várias pessoas falam espanhol e escutam reggaetón

Ela disse que quando chegaram, pegaram um táxi para a casa de sua sogra. Ela lembra que fazia frio.
Nunca tinha visto a neve. "Tinha medo de congelar", ri de si própria.
Eram quatro da madrugada. Estava escuro. Não conseguia ver nada. Ela ainda não sabia que tudo ia ficar bem; que faria parte de uma grande família que a adoraria.
Quando seu novo marido bateu à porta de sua casa, ela só sabia de uma coisa: ela passara por uma experiência bem ruim. Uma coisa que acontece com mulheres o tempo todo, até hoje.
Era um segredo no qual pensaria às vezes, mas que nunca contaria a ninguém, até 60 anos depois, já como viúva e com netos. Naquele momento, sabia que tinha sido capaz de sobreviver; que tinha conseguido sair e que ia construir algo mais: uma boa vida.
Francisca Carmona García, mais conhecida pelas pessoas que a amam como Frances, finalmente estava em casa.
BBC
Professor Edgar Bom Jardim - PE