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sexta-feira, 14 de julho de 2017

A alfabetização da vida real: quando um aluno recua e outro avança


Olá, alfabetizadores!
Em abril, eu comecei a contar a vocês, em outro post no Blog, a trajetória de aprendizagem de dois alunos da minha turma de Alfabetização desse ano: o menino agitado e a menina que ainda não acreditava que podia aprender.
Mais um bimestre se passou. Quantas coisas aconteceram em minha sala de aula nesse período! Foram muitas atividades para dar continuidade ao processo de alfabetização de meus alunos. Eles até escreveram livros de lengalenga e outro com historias acumulativas, mas isso é assunto para outro post!
Em relação ao desenvolvimento dos meus dois alunos, trago algumas boas notícias, e outras nem tanto.
1. O menino agitado
Ele estava mais calmo, vinha participando das atividades com vontade de aprender e avançava em sua aprendizagem. De repente mudou seu comportamento, devido a fatores externos e que vão além do meu entendimento. Acabou voltando à etapa inicial!
O pequeno anda arredio e novamente agitado, o que atrapalha o desenvolvimento de sua aprendizagem, que agora vai acontecendo de forma mais lenta e difícil.  Porém, como eu havia dito em abril, a atenção especial a ele deve perdurar por todo o ano. Isso me deixa um pouco frustrada e cansada, afinal, é preciso que todos avancem e aprendam. Mas não desisto!
Mesmo não sendo fácil, me esforço sempre para tentar entendê-lo, com muito diálogo e paciência e sempre oferecendo propostas de atividades para alfabetizá-lo. Quando não dou conta, peço auxílio à minha coordenadora, ou à diretora, alguma colega professora ou mais alguém da equipe escolar. Todos também conversam muito com ele, e com a família também.
Muitas vezes, em nossas turmas, temos alunos assim, com altos e baixos, tanto em relação a seu emocional, quanto a sua aprendizagem. Apesar de ser uma situação desgastante, é muito bom saber que não estou só, e que faço parte de uma equipe unida e que se apóia. Temos consciência que esse aluno é de todos nós.
2. A menina que achava que não podia aprender
Já a minha aluna que estava na hipótese pré-silábica e que acreditava que não podia aprender avançou muito em seu processo de alfabetização. Mas também não foi fácil: foram vários dias de choro, chamadas de atenção, orientações para que participasse das atividades, muita conversa e muitas atividades de leitura e escrita.
Com base nos primeiros avanços em sua aprendizagem, nas primeiras palavras lidas e escritas, ela tornou-se mais confiante. O choro foi dando espaço para risadinhas e uma alegria sem fim! Segundo ela mesma disse: "Quero aprender bastante, cada vez mais para deixar a minha mãe feliz e orgulhosa, para escrever cartinhas, para ler tudo!".
Para ela, além das atividades do dia a dia em sala de aula, preparei um plano de alfabetização com variadas atividades de leitura e escrita, especialmente voltado para atender suas necessidades de aprendizagem.
Entre as várias atividades, destaco uma permanente que desenvolvi com ela e outros alunos que precisavam de uma atenção mais individualizada: diariamente, havia leitura e escrita de listas de nomes, a partir dos temas estudados em sala: lista de compras da família, de roupas para o frio, de verduras e legumes para sopas e saladas, de animais, etc).
O ponto forte da atividade é o uso das letras móveis. Antes de registrar nos cadernos, os alunos construíam suas escritas com o auxílio das letras móveis. As crianças adoram escrever com esse material, para eles é uma divertida brincadeira!
Atividade: leitura e escrita de listas com as letras móveis
A primeira escrita feita pelos alunos com as letras é o nome completo de todos. Ela fica fixa na carteira de cada um, e serve como uma das referências para as escritas das listas, além dos nomes dos alunos da turma. No uso das letras móveis, as crianças percebem melhor o formato e as diferenças entre as letras. Isso facilita a identificação para a escrita e dá mais autonomia aos pequenos.
Depois que eles escrevem suas listas, sento com cada um para fazer as intervenções pedagógicas, questionando-os sobre a construção de suas escritas. É nesse momento também que eles, ao lerem as próprias palavras escritas, conseguem perceber com mais facilidade as letras que faltam, que não são necessárias ou que precisam ser trocadas.
Proponho também, em alguns momentos, as escritas em duplas produtivas de alunos com hipóteses próximas. Em outros momentos, dou aos alunos as letras certas para escrita de uma determinada palavra, quando dito palavras que devem fazer parte da lista. Essa variação na atividade faz com que o aluno reflita, confronte suas hipóteses e consequentemente avance.
Essa atividade diária contribuiu significativamente para a aprendizagem de minha aluna, que passou da hipótese pré-silábica para a alfabética. Mas ainda há muito caminho a percorrer para a alfabetização! Espero que o próximo capitulo desse meu diário tenha ainda mais boas notícias!
E você, querido professor alfabetizador, tem alunos com os meus na sua turma? O que você anda fazendo para que todos avancem na alfabetização? Compartilhe conosco, aqui nos comentários!
Um grande abraço, até a própria segunda-feira e boas férias para quem conseguiu dar a merecida parada!
Mara Mansani - Nova Escola.
Professor Edgar Bom Jardim - PE

segunda-feira, 3 de julho de 2017

Flexibilização do Ensino Médio: ainda há mais perguntas do que respostas

Quatro meses após a aprovação da reforma do Ensino Médio, professores, escolas e até mesmo parte do poder público ainda têm muitas dúvidas sobre o novo modelo. Reunidas em São Paulo para o debate “Desafios Curriculares do Ensino Médio: implementação e flexibilização”, realizado pelo Instituto Unibanco, as secretarias estaduais de Educação mostraram o que têm feito sobre a reforma e os problemas que devem ser enfrentados para que ela aconteça de fato. No entanto, alguns pontos ainda são uma incógnita até mesmo para esses atores.

Os estados já lançaram ações para avançar nessa discussão e planejar como se dará a reforma. Grupos de estudo e de trabalho foram formados para questões como desenhar uma proposta curricular flexível (uma das principais características do novo modelo), conhecer melhor o perfil socioeconômico de cada região de forma a compreender a oferta e demanda dos jovens e estabelecer parcerias de assistências técnicas com institutos e organizações privadas. Os planejamentos mudam de acordo com a realidade de cada estado, mas preveem organização de arranjos entre escolas, formação inicial e continuada do corpo docente e gestores, novas formas de contratação de professores, apoio técnico para revisão dos currículos e implementação do novo modelo.

As discussões, porém, ficam limitadas pelas incertezas em alguns pontos. Confira os principais:

Estados perdidos com tantas possibilidadesA flexibilização abre muitos caminhos para os estudantes do Ensino Médio. Além dos cinco percursos propostos à escolha do aluno (Linguagens, Matemática, Ciências da Natureza, Ciências Humanas e Formação Técnica e Profissional), há a possibilidade de misturá-los, já que não é obrigatório que as escolas ofereçam todos. A opção de Formação Técnica e Profissional abre outra infinidade de alternativas e cada unidade – independente da rede – pode optar pelo formato que cabe melhor dentro de sua realidade.

Como alinhar tudo isso com a expectativa dos jovens sobre essa etapa de ensino? “Não tenho nenhum problema em dizer que todos nós estamos um tanto perdidos, porque a cada momento se abre uma nova possibilidade para o desenvolvimento dessa proposta e temos sempre a dúvida do que virá”, diz Júlio Gregório, Secretário de Educação e membro do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed).

O Distrito Federal estabeleceu uma parceria com o Insper para analisar as possíveis formas de implementação de um modelo que corresponda às expectativas dos estudantes.

Crédito: Pillar Pedreira/Agência Senado

Ausência da Base do Ensino Médio impede aprofundamento das discussõesJúlio também aponta a dificuldade de trabalhar com uma base curricular indefinida, já que devido à reforma, o documento da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) foi entregue ao Conselho Nacional de Educação (CNE) apenas com a Educação Infantil e do Ensino Fundamental. “Nós podemos fazer uma discussão e depois vir a Base e o CNE dizer: não é nada disso”, justifica.

A preocupação também apareceu na fala de César Callegari, presidente da Comissão da BNCC no órgão, sob a perspectiva da progressão. “Já alertamos sobre o problema de termos uma base nacional com proposta fatiada. É um grande problema pensar progressão quando não conseguimos enxergar ainda como é o final”, comenta. De acordo com ele, as etapas deveriam ter sido pensadas integralmente.

O ponto é rebatido pelo secretário de Educação Básica, Rossieli Soares. A progressão teria sido também um desafio nas duas primeiras versões da Base, que contemplavam o Ensino Médio, já que se trata de um documento complexo e de construção coletiva. “É possível, sim, fazer uma análise daquilo que o Fundamental precisa contemplar. Depois podemos discutir qualquer adaptação necessária com a BNCC do Médio”, defende Rossieli.

A realidade de cidades com apenas uma escolaO ideal é que todas as escolas brasileiras pudessem oferecer os cinco percursos previstos para que os alunos pudessem escolher, de fato, a área em que desejam se aprofundar no Ensino Médio. O Ministério da Educação recomenda que cada escola oferte pelo menos dois. Alguns estados já adiantam que a realidade de determinados municípios permitirá apenas um.

Isso não seria um problema tão grande se houvesse escolas próximas ofertando outros itinerários e com infraestrutura para receber outros alunos interessados. No entanto, estados como Rio Grande do Norte e o Pará mostram que o desafio é maior do que se pode imaginar. Dos 144 municípios paraenses, 57 têm somente uma única escola de Ensino Médio e 30 deles têm duas. Dos 167 potiguares, 135 contam com apenas uma escola. “Como pensar em itinerários e não em itinerário com 135 municípios com essa situação? Isso já sinaliza a dificuldade imensa de pensar a logística e o pedagógico em uma proposta”, diz Cláudia Santa Rosa, da Secretaria de Educação do Rio Grande do Norte.

Além disso, o Pará, por exemplo, tem um território de grandes dimensões (o estado ocupa 14,65% do Brasil), com cerca de 18% das matrículas do Ensino Médio em zona rural e áreas de difícil acesso. Em locais como Santa Catarina, a possibilidade de municípios próximos permitirem integração entre as redes é parte do planejamento.

Discutir ao invés de ir de acordo com as características do municípioOlhar para as características socioeconômicas do município não é suficiente para atender às perspectivas dos estudantes. O caso do Pará, trazido por Ana Claudia Serruya Hage, secretária de Educação do estado, é um exemplo concreto.

Uma região do estado que tem na pesca uma de suas principais atividades, o governo investiu em uma escola profissionalizante que incluía diferentes cursos com esse foco. “Sabe quantos alunos se inscreveram? Um. Porque ninguém quer o futuro do seu pai. Eles não querem estudar pesca, eles querem fazer outra coisa”, expõe Ana Claudia. “Nós estamos numa tendência de discutir primeiro, não levar nada pronto para o município, trabalhando audiência pública, pesquisa, para conseguir entender e aí tentar nesse meio colocar a discussão do financiamento”, conta.

Incluir os alunos nas discussões é essencial para repensar o modelo. No entanto, não resolve tudo. Crédito: Shutterstock

As escolhas não são só uma questão de democraciaA partir do ponto anterior, pode parecer que a solução para atender às expectativas dos alunos seja ouvi-los sobre isso e envolvê-los na decisão. Em parte, é verdade. No entanto, a estruturação dos itinerários passa por um outro impasse quando se trata dessa questão.

“Hoje eles são alunos de determinada escola. Mas, no próximo ano ou daqui a dois anos, provavelmente já terão se formado. Como decidir para quem vem depois?”, questiona Cláudia Santa Rosa, da Secretaria de Educação do Rio Grande do Norte. “É um debate que a gente precisa fazer para definir melhor o campo de participação dos estudantes, que é importantíssimo. Alterar a oferta de itinerários depois de um tempo precisa ser muito bem planejado, porque mexe com professor, com concursos, com convocação, com infraestrutura”, analisa.
Fonte: Nova Escola
Professor Edgar Bom Jardim - PE

segunda-feira, 26 de junho de 2017

Jovens violentos abandonam a escola mais cedo, diz pesquisador



Crédito: Shutterstock

A Educação brasileira de hoje tem índices melhores que há uma década. Todas as etapas têm aumento da taxa de aprovação e redução do abandono em relação a 2007. Esses dados foram divulgados nesta quarta pelo o Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira) com base nas informações dos Censos escolares de 2014 e 2015. Mas, apesar da evolução em várias áreas, o resultado ainda é preocupante.
Os piores índices estão no Ensino Médio: a média de evasão escolar na etapa é de 11,2%, e com 12,9% só no 1º ano. No Ensino Fundamental, os números são um pouco mais agradáveis, com média de 2,1% de abandono nos anos iniciais e 5,4 nos anos finais.
Apesar de baixa quando comparada com o Ensino Médio, um estudo do sociólogo Marcos Rolim mostra que a evasão na transição do Ensino Fundamental 1 para o Ensino Fundamental 2 pode ser especialmente danosa. Ele analisou as respostas de 111 pessoas, e identificou um fator em comum a todas que se envolveram com o crime: o abandono aos estudos muito cedo. “Os mais violentos tinham saído da escola muito precocemente, com 10, 11, 12 anos. Não havia uma exceção”, afirma o pesquisador.
Marcos estuda segurança pública há mais de 20 anos. Baseado em uma experiência norte-americana registrada no livro Why they kill (Por que eles matam), do jornalista Richard Rhodes, ele decidiu repetir a investigação com brasileiros, que registrou no livro A formação de jovens violentos – Estudo sobre a etiologia da violência extrema. A ideia inicial era entrevistar um grupo de jovens, homens, envolvidos com atos de violência extrema. O pesquisador conversou com 17 que estavam na Fundação de Atendimento Sócio-Educativo (Fase), antiga Febem do Rio Grande do Sul, alguns inclusive com múltiplos homicídios. A intenção era saber mais sobre suas vidas anteriores aos crimes cometidos e à prisão.
Os jovens também indicaram um colega de infância que não tinha se envolvido com o crime, para Marcos buscar padrões e diferenças nessas histórias que pudessem explicar a “inclinação violenta” (que Marcos chama de “disposicionalidade”, por acreditar que é fruto tanto de questões internas quanto sociais) que certas pessoas de um mesmo grupo social têm, enquanto outras não.
“Repeti as entrevistas com onze desse segundo grupo. Como eram poucos, não consegui chegar a grandes conclusões, então ampliei a amostra aplicando um mesmo questionário para jovens presos por crimes violentos e não violentos, e outros da periferia de Porto Alegre, que não tinham nenhuma relação com o crime”, explica Marcos. Veja a seguir suas descobertas.


O pesquisador Marcos Rolim (Divulgação / Ramon Moser)

Quais foram as principais conclusões da sua pesquisa?
Todos os jovens eram pobres, moradores de áreas de exclusão, e muitos viveram situações de violência na família. Os mais violentos tinham saído da escola muito precocemente, com 10, 11, 12 anos. Não havia uma exceção. Eu imaginava, por exemplo, que os jovens que matam são de famílias violentas, desestruturadas. Mas não, há aqueles que vêm de famílias em que tudo em tese estava correndo bem, até a saída da escola. Quando olhei para o grupo maior, vi que a baixa escolarização e o treinamento para o crime foram os dois fatores que mais apareceram em comum àqueles que tinham mais disposição para a violência. O treinamento é quanto tem a presença de alguém mais velho que introduz esse jovem no mundo do crime.
Esses traficantes mais velhos fariam o papel de professor?
Exatamente. A ruptura com a escola desvinculou o menino do único senso de grupo que ele tinha. O traficante que o recebe é poucos anos mais velho do que o iniciante, mas faz as vezes de professor, instrui, socializa nos valores do novo grupo.
Quais foram os motivos que os jovens deram para terem saído da escola?
Foram três motivos principais. Havia uma sensação de que eles eram incapazes de aprender. Eles falavam “Eu sou burro mesmo, não dou pra isso, repetia de ano”. Essa ideia de que a culpa é deles, de que há algo de errado neles, é uma visão equivocada, porque é obrigação da escola ensinar. Havia os que sofriam bullying pela pobreza. Todos eram pobres na escola, mas alguns eram ainda mais pobres do que os outros: usavam sapato furado, camisa rasgada, e eram humilhados pelos demais. Eles acabavam saindo para evitar essa humilhação, inclusive entravam para o crime na tentativa de se vingar disso. Também teve quem falou que a escola é um espaço desinteressante, que era um saco estar lá, os professores eram chatos. E tenho a impressão de que há uma distância enorme entre o mundo em que os jovens vivem, da internet, da conectividade, e o mundo em que a escola vive.
Como a escola pode concorrer com o universo do crime?
Talvez a única chance de a escola disputar esse espaço é com relação à autoria de uma pessoa. Jovens extremamente pobres têm a sensação de serem nada, e isso no fundo corresponde muito à realidade social brasileira. De fato, no Brasil, ele é nada, reconhecido em lugar nenhum. O tráfico oferece um espaço de pertencimento, onde eles são valorizados. E quando faz parte do grupo, tem uma arma na cintura, pode comprar roupas de grife, ele passa a ser alguém admirado na vila onde mora. O máximo que a escola oferece é uma promessa futura, com um cotidiano cheio de tarefas burocráticas, sabe? Acho que essa preocupação da autoria na escola, como ele pode ser alguém, o que ele pode produzir, realizar, como esportes, poesia, hip hop, artes, deve ser central.
A evasão escolar deveria virar assunto de segurança pública?

Teríamos que fazer um estudo mais aprofundado sobre evasão, mas a minha impressão é de que quanto mais cedo a criança sai da escola, maiores as chances de se envolver com o crime. Nas prisões norte-americanas, há um grupo muito pequeno de pessoas que terminaram o Ensino Médio. A grande maioria não terminou. Aqui, o corte é ainda mais baixo. A grande maioria da população carcerária brasileira não terminou o Ensino Fundamental. A quantidade de escolarização é muito importante para permitir que o sujeito escape dessas dinâmicas ilegais de sobrevivência, que podem levar à prisão. Não acho que a escola deva ser assunto de segurança, mas a pesquisa deixa claro que o desempenho da escola acarreta consequências na segurança pública. A evasão escolar é um tema central para se pensar a violência do Brasil, mas não deve ser só isso. O ideal seria ter evasão zero como nossa meta. Precisamos entender e combater os motivos pelos quais esses meninos estão saindo da escola.
Nova Escola.
Professor Edgar Bom Jardim - PE

quarta-feira, 21 de junho de 2017

Lutas que devem continuar

A escola é o espaço essencial para formação do cidadão. Quando a escola, a educação, o professor e a comunidade não faz a lutas pelo que é bom, o mal vai triunfar e só haverá tristeza, desigualdade, tragédias para gerações futuras. O Brasil da corrupção que vivemos hoje é reflexo da covardia de muitos no passado e no presente. Quais serão as consequências? A selva, o salve-se quem poder? 
Como é bom ter a consciência de que fizemos a boa luta, o bom combate promovendo cidadania, e justiça social por meio da educação.
Professor Edgar Bom Jardim - PE

segunda-feira, 19 de junho de 2017

Veja como usar a moda do spinner como uma aliada na sala de aula

O brinquedo, sensação entre a garotada, pode ser usado como tema para o professor trabalhar diferentes conteúdos

Os especialistas questionam a eficácia do spinner. O principal problema é justamente a falta de algum estudo que comprove cientificamente os benefícios terapêuticos do objeto.
"Creio que para algumas crianças até ajude a focar a atenção por um curto período. Pode ter um efeito relaxante, como rodar a caneta entre os dedos, mas não parece ser eficaz", comenta Eliane Bixofis, pediatra especialista em déficit de atenção. É a mesma opinião do norte-americano Mark Rapport, autor de um estudo sobre os benefícios do movimento para pessoas com TDAH. “É mais provável que esses objetos sirvam como uma distração, mas não proporcionam nenhum benefício para quem possui o transtorno de déficit de atenção”, afirmou em entrevista ao site Live Science.
Como o professor pode tirar proveito dessa onda
Eficaz ou não, o spinner é uma mania nas escolas, e o professor pode usar isso em seu favor. Debora Garofalo, professora de sala de informática da EMEF Almirante Ary Parreiras, em São Paulo, e colaboradora de tecnologia de NOVA ESCOLA, aproveitou a moda para engajar a turma.
Muitos de seus alunos moram em um bairro na periferia de São Paulo e não tinham acesso ao spinner. "Nas aulas de robótica, eles me pediram para construir o seu próprio spinner. Vi um grande potencial para trabalhar conteúdos por meio do estímulo à criatividade", conta. “Os professores não devem enxergá-lo como um inimigo. Ao explorar o seu potencial, podemos desencad0ear atividades pedagógicas que aproximam a classe". Ela propõe que ele pode ser utilizado em diversas áreas do conhecimento, como em Matemática, Física ou até mesmo Língua Portuguesa, ao debater a finalidade, contexto histórico e funcionamento, analisando o modo como ele gira, a velocidade e as formas geométricas.
A atividade foi realizada com alunos de 7º e 8º anos do Ensino Fundamental. Primeiro, a classe comprou um spinner original para usar como um modelo. Depois, a professora perguntou aos alunos como o objeto girava e de que forma seria possível adaptar esse movimento. “Eles sugeriram que uma tampinha de garrafa furada ao meio poderia ser encaixada em um palito de churrasco, criando o atrito necessário”, conta.
As demais tampinhas foram colocadas para caracterizar o spinner. “Fomos testando diversas combinações e discutindo sobre os erros durante a montagem, como a realização do furo central”, explica. “Nós furamos a tampa com ferro de solda, o que fez com que o orifício ficasse maior do que o palito. A solução veio com a cola quente, passada de uma ponta à outra no palito, além de ser usada para unis as outras tampinhas."
Nova Escola
Professor Edgar Bom Jardim - PE

O Pai Nosso é uma oração universal?

Muitas vezes, repetimos práticas do Cristianismo dentro da escola acreditando que elas são comuns a todas as religiões. Mas em matéria de fé, nada é universal

Depois da publicação de nossa reportagem “Entre a cruz e a sala de aula”, capa da edição nº 302, de maio de 2017, recebemos uma dúvida de uma professora: o “Pai Nosso” é uma oração universal?  Ele estaria “liberado” para ser reproduzido no ambiente escolar sem ferir a fé de outras pessoas?
Em outros relatos e algumas visitas que fizemos a escolas pessoalmente, professores compartilharam conosco as práticas comuns de suas escolas, como ensinar crianças a cantar músicas religiosas e colocar objetos de uma religião específica em exposição pela escola.
Mais do que simplesmente responder “sim”, “não”, “pode fazer” ou “Não pode fazer”, convidamos você, educador, a refletir conosco. Não queremos fazer um certo ou errado, mas a caminhar juntos por um assunto delicado. Vamos nessa?
A Constituição
O Estado brasileiro é laico, de acordo com a Constituição de 1988. Isso significa que não temos uma religião oficial. Outros países têm – a nossa vizinha Argentina, por exemplo, tem escrito em lei que o catolicismo é a religião oficial do país.  
No caso brasileiro, o Estado não pode promover uma religião. Suas instituições públicas, como escolas, hospitais, câmaras de vereadores, o Congresso Nacional, por consequência, também não. Só que o mundo é mais complicado. Nos últimos anos, as bancadas cristãs no Congresso Nacional vêm defendendo a ideia de que o Estado é laico – mas as pessoas, não. Por esse argumento, o Estado não poderia promover nenhuma religião – mas também não poderia impedir as pessoas de se manifestarem a sua religiosidade, mesmo em ambientes públicos. Isso trava o debate sobre a retirada de símbolos religiosos de escolas e tribunais, por exemplo. Pelo argumento dos parlamentares religiosos, o Estado não pode colocar uma cruz, mas as pessoas podem. E, neste ponto, a conversa começa a se radicalizar.
O Pai Nosso
Na Bíblia – livro sagrado para os católicos e os evangélicos, religiões que são maioria no Brasil, de acordo com dados do Censo de 2010 -, o “Pai Nosso” (ou Oração Dominical, ou Oração Modelo) aparece em dois momentos, nos evangelhos de Mateus e Lucas. Na narrativa, Jesus Cristo usa os versos para mostrar aos seguidores como eles deveriam se dirigir a Deus em suas preces.
Há religiões, como a católica, que repetem o Pai Nosso ao pé da letra em seus cultos, em forma de reza. E há outras que preferem usá-lo como modelo para se inspirarem, fazendo suas próprias preces. O espiritismo kardecista, por exemplo, reconhece a figura de Cristo e utiliza o Pai Nosso, mas altera algumas frases. Assim, mesmo dentro das religiões que acreditam na santidade de Jesus Cristo, já há divergências sobre o uso do Pai Nosso nos cultos – e mesmo sobre que passagens que estão ou não nessa oração. Como a Bíblia teve muitas traduções, há divergências sobre qual a melhor forma da oração.
Portanto, o Pai Nosso não é universal, ao menos como prece, nem dentro do cristianismo.
Outras religiões
A Bíblia é dividida em dois grandes conjuntos de livros: o Antigo e o Novo Testamento. Os dois evangelhos (de Mateus e Lucas) fazem parte do Novo Testamento, aquele que conta a vida de Jesus Cristo. O Antigo Testamento conta a trajetória do povo hebreu, sua história, seus profetas e suas orações, e é aceito por outras religiões, como o judaísmo. O Novo Testamento, não. Ele é cristão por definição.
No judaísmo, o livro principal se chama Torá, com os cinco primeiros livros do Antigo Testamento, e é complementado pelo Talmude (constituído de tradições orais e comentários). No Islamismo, utiliza-se o Alcorão, que mistura passagens do Antigo Testamento com outros momentos de revelações recebidas pelo profeta Maomé em Meca e Medina. Já deu para ver a diversidade que existe mesmo em um terreno aparentemente homogêneo, não é mesmo?
E por que a confusão?
Nossa colonização cristã fez da religião católica não apenas a majoritária, mas a oficial do Estado até 1891. De certa forma, até hoje o catolicismo é muito forte em nosso cotidiano. Essa tradição acaba causando algumas confusões. Por acreditarmos que a ampla maioria da população compartilha dos mesmos credos, repetimos pequenas ações que envolvem a religião dentro dos ambientes escolares.
“A Educação brasileira foi uma extensão da Igreja por muitos anos, e isso se reflete nas posturas”, explica Simone Riske-Koch, professora da Licenciatura em Ensino Religioso, coordenadora do fórum das licenciaturas em Ensino Religioso e autora das duas primeiras versões da Base Nacional Comum. Tais posturas precisam passar por duas reflexões importantes: 1) Todos (absolutamente todos) os envolvidos estão confortáveis com a iniciativa? 2) No que essa atividade contribui com o processo de ensino e aprendizagem?
Na prática
Na primeira reflexão, lidamos com a dificuldade de pensar em um contexto que consiga englobar todas as pessoas. Por mais que o Pai Nosso seja rezado pela maioria das pessoas da escola, se uma única pessoa segue uma religião de matriz diferente da cristã, os atos de fé, apesar de serem bem-intencionados, podem acabar causando constrangimentos.
Em outro relato recebido por NOVA ESCOLA, uma educadora diz aproveitar os momentos de oração antes da aula para “acalmar a turma”. A professora Simone explica que certamente as orações têm essa capacidade de deixá-los mais serenos antes de iniciar os trabalhos, mas há outras maneiras de se fazer isso que não precisam envolver religião. “O professor pode fazer momentos de meditação que não estejam necessariamente ligados a uma fé”, sugere.
Com isso, não queremos pedir que você, leitor, renegue a sua fé. O que vale considerar é a reflexão sobre os momentos mais adequados para expressá-la. “Não temos como deixar nossa fé do portão da escola para fora, mas devemos gerenciar para que ela não interfira em nossa prática docente”, diz Simone. Uma sugestão, por exemplo, é aproveitar o texto do Pai Nosso e fazer uma pesquisa com a turma sobre outras orações fundamentais de religiões de outras matrizes – como a indígena, a africana, a budista, a islâmica, a judaica, etc. Em vez de praticar essas orações, a turma pode ler e estudar criticamente o significado daqueles versos, comparando semelhanças e diferenças entre as crenças. Eles poderão descobrir, por exemplo, que há vertentes da umbanda, uma religião de matriz afro e que poucos relacionam com a Bíblia, que rezam o Pai Nosso, enquanto outras, não.
Com respeito pela diversidade e compromisso com todos e todas, é possível falar de religião na escola sem deixar ninguém de fora.
Paula Peres. Nova Escola
Consultoria: Javan Ferreira, pedagogo, teólogo e pastor
Imagens: Deus Segundo Laerte / Laerte / 2005 / Editora Olho D'Água
Professor Edgar Bom Jardim - PE

segunda-feira, 29 de maio de 2017

Pesquisa identifica evasão escolar na raiz da violência extrema no Brasil


Grupo de 20 adolescentes recapturados após fuga de unidade de internação no DF em dezembro de 2015Direito de imagemMARCELO CAMARGO/AGÊNCIA BRASIL
Image captionAdolescentes recapturados após fuga de unidade de internação no Distrito Federal em 2015; estudo analisou formação de jovens violentos

Dois grupos de jovens de idade semelhante, todos homens, pobres e criados na mesma região. Um grupo vira matador e o outro, trabalhador. Por quê?
O sociólogo Marcos Rolim procurou essa resposta ao investigar a violência extrema, aquela que mata ou fere mesmo quando não há provocação nem reação da vítima. Modalidade que, acredita ele, está em alta no Brasil.
Em experimento inédito no país, ele entrevistou um grupo de jovens violentos de 16 a 20 anos que cumpriam pena na Fase (Fundação de Atendimento Socioeducativo) do Rio Grande do Sul. Ao final, pediu que indicassem um colega de infância sem ligação com o crime e foi atrás dessas histórias.
Rolim esperava que prevalecessem, no grupo dos matadores, relatos de violência familiar e uso de drogas, mas outro fator se destacou: a evasão escolar (quando o aluno deixa de frequentar a escola). E, aliado a isso, a aproximação com grupos armados que "treinam" esses jovens a serem violentos.
Entre os que cumpriam pena, todos, sem exceção, tinham largado a escola entre 11 e 12 anos. E citavam motivos banais: são "burros" e não conseguem aprender, a escola é "chata", o sapato furado era motivo de chacota. Os colegas de infância continuavam estudando.
Ao comparar esses e outros casos (111 ao todo), incluindo dois grupos de presos jovens do Presídio Central de Porto Alegre, uns condenados por homicídio e outros por receptação, e alunos de uma escola de periferia sem histórico criminal, concluiu que o chamado "treinamento violento" respondeu por 54% da disposição para a violência extrema.
Em outras palavras, isso significa que sem a experiência do "treinamento violento" - aquela que ensina a manusear armas, bater antes de apanhar e exalta atos de violência - a disposição para esses crimes extremos cairia para menos da metade nos casos analisados.
As conclusões de Rolim, que foi vereador em Santa Maria (1983-1988), deputado estadual (1991-1999) e deputado federal pelo PT gaúcho (1999-2003) e hoje não tem filiação partidária, estão no livro recém-lançado A Formação de Jovens Violentos - Estudo sobre a Etiologia da Violência Extrema (editora Appris).

Marcos RolimDireito de imagemRAMON MOSER/REPRODUÇÃO
Image captionTese de doutorado em Sociologia de Marcos Rolim, publicada em livro, investigou a formação de jovens violentos no Brasil

"Muitos meninos que se afastam da escola são, de fato, recrutados pelo tráfico de drogas e são socializados de forma perversa. E isso provavelmente deverá se repetir se a pesquisa for reproduzida em outros locais, pois a diferença estatística foi muito forte", diz Rolim à BBC Brasil.
A conclusão prática, segundo o sociólogo, é que a prevenção da criminalidade deve levar em conta a redução da evasão escolar, aspecto que costuma ser negligenciado no Brasil quando o assunto é segurança pública.
Considerados os índices de evasão escolar, o cenário no Brasil seria, de fato, favorável à violência extrema.
Em 2013, por exemplo, uma pesquisa do Pnud (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) mostrou que um a cada quatro alunos que inicia o ensino fundamental no país abandona a escola antes de completar a última série.
O Brasil figurava no estudo com a terceira maior taxa de abandono escolar entre os 100 países de maior IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), atrás apenas da Bósnia e Herzegovina e do arquipélago de São Cristóvão e Névis.

Razões da evasão

E por que as escolas não conseguem manter esses jovens na escola?
Embora o assunto não tenha sido foco da pesquisa, Rolim arrisca algumas possíveis explicações, a partir do contato com colegas que desenvolvem pesquisas em instituições de ensino.
A primeira, diz, é o despreparo de professores para lidar com alunos mais vulneráveis e problemáticos.
"O jovem de área de exclusão, que nunca abriu um livro e tem pai analfabeto, tem toda uma diferença de preparação, e grande parte dos professores não está preparada para lidar com ele", afirma.

Unidade da Fase (Fundação de Atendimento Socioeducativo) do Rio Grande do SulDireito de imagemKARINE VIANA/PALACIO PIRATINI
Image captionFase (Fundação de Atendimento Socioeducativo) do Rio Grande do Sul; internos abandonam escola cedo, aponta pesquisa

Rolim cita como exemplo um caso recente registrado em Porto Alegre.
"A pesquisadora presenciou uma cena de indisciplina de um aluno de 10 anos em uma turma pequena; a professora conhecia todos. Ela disse ao menino: 'Tu vai ser bandido como seu pai'. Esse tipo de reação é inaceitável", conta.
Outra possível causa, segundo Rolim, está na falta de conexão das escolas com as comunidades em regiões violentas.
"Pelo medo do crime, a escola deixou de se relacionar com as comunidades nas periferias. Transformaram-se em bunkers com grades, cadeados, polícia na frente. Não prestam serviços, não abrem aos finais de semana, pais e parentes não a frequentam."
O terceiro problema seria a própria educação oferecida na escolas públicas.
"Basicamente, a mesma de 50 anos atrás", afirma o sociólogo.
"Hoje é impossível lidar com crianças conectadas, mesmo as mais pobres, do mesmo jeito. A escola se tornou espaço de pouco interesse e atração para o jovem das periferias", acrescenta.

Violência futura

Em 2015, último dado disponível, o Brasil registrou 170 assassinatos por dia - foram 58 mil homicídios naquele ano, número mais alto do que os de países em guerra. A taxa daquele ano, de 29 casos por 100 mil habitantes, insiste em não baixar.
Na visão de Rolim, o Brasil está "contratando violência futura" em escolas, prisões e nas próprias instituições policiais.
Nas prisões, isso se dá, segundo ele, pela reclusão por crimes patrimoniais.
Dados do governo mostravam que, ao final de 2014, 66% da população carcerária brasileira estava atrás das grades por crimes de drogas, roubos ou furtos - casos de homicídios eram apenas 10%. Jovens negros e de baixa escolaridade são maioria.
"Temos um perfil de encarceramento que não pega autores de crimes mais graves, e pegamos um monte de jovens pobres na periferia, pequenos traficantes e usuários, e vamos recrutando essas pessoas para as facções que atuam nos presídios", diz Rolim, para quem o Estado brasileiro é o "principal recrutador de mão de obra para as facções criminosas".

Rebelião em presídio de Alcaçuz, RNDireito de imagemAGÊNCIA BRASIL
Image captionRebelião em presídio no Rio Grande do Norte; para pesquisador, prisões de jovens pobres da periferia flagrados com drogas e armas não surtem efeito positivo na segurança pública

E os homicídios continuam em alta - estudo recente do Fórum Brasileiro de Segurança Publica mostrou, por exemplo, que um em cada três brasileiros diz ter parente ou amigo vítima de assassinato - porque falta investigação e foco dos governos nesse problema, opina o pesquisador.
"A redução dos homicídios não é a prioridade número 1 em nenhum lugar do Brasil. Como grande parte das vítimas é pobre, não há pressão social para investigação. E você lança uma mensagem de que o crime compensa", afirma Rolim. Estudos costumam apontar que menos de 10% dos homicídios no Brasil resultam em condenação.
O investimento, avalia o especialista, deveria ser reforçado na repressão a homicídios e a crimes sexuais.
"E se for para continuar a política de repressão ao tráfico, temos que ir atrás de financiadores, rotas e usar muito mais inteligência do que em prisões em flagrante", argumenta.

Iniciativas de resultado

No meio do que classifica como "desgraça geral" das políticas de segurança no Brasil, Rolim destaca iniciativas voltadas a jovens que mostraram bons resultados na prevenção da violência.
O POD (Programa de Oportunidades e Direitos) RS Socioeducativo, criado em 2009 no Rio Grande do Sul, atende jovens infratores de 12 a 21 anos que deixam o sistema de internação.
Cada jovem passa a receber, por um ano, uma bolsa de meio salário mínimo (R$ 468,50), vale-transporte e alimentação, desde que frequente cursos de formação em áreas como informática, mecânica e manutenção predial.
Segundo o governo gaúcho, a cada dez jovens atendidos pelo programa, apenas três reincidem no crime.
No entanto, Rolim acredita que iniciativas semelhantes ainda sejam pouco divulgadas.
"A população gaúcha, por exemplo, pouco sabe da existência desse programa, porque gestores ficam provavelmente com medo de divulgar e serem criticados por 'estarem dando dinheiro a bandidos'", diz.
"Essa ideologização do tema da segurança pública é outro lado tenebroso dessa história; você acaba perdendo a capacidade de execução de políticas no setor", acrescenta.
A cidade de Canoas, na Grande Porto Alegre, criou o programa Cada Jovem Conta, que procura identificar jovens de escolas públicas com comportamento de risco para ações de prevenção à violência.
O jovem passa ser acompanhado por uma equipe de diferentes secretarias, como saúde, educação e assistência social, para que frequente atividades esportivas e culturais, entre outras.
A prefeitura de Canoas afirma que mais de 60% dos jovens atendidos melhoraram o desempenho escolar ou voltaram à escola, e suas famílias passaram a frequentar mais os serviços públicos locais.
Neste mês, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado aprovou um projeto do senador afastado Aécio Neves (PSDB-MG) que altera o Estatuto da Criança e do Adolescente para elevar de três para oito anos o tempo máximo de internação para jovens infratores.
A medida, que ainda deverá ter mais uma votação na comissão antes de ir à Câmara, valeria para atos infracionais análogos a crimes hediondos - como estupro e homicídio - cometidos com uso de violência ou grave ameaça.
Rolim diz concordar com o aumento do tempo de internação para um "perfil restrito de jovens" reincidentes, mas criticou a associação com crimes hediondos, que no Brasil incluem o tráfico de drogas.
"Isso colocaria a maioria dos jovens sob a possibilidade de (cumprir) oito anos de pena. Hoje se um jovem der um cigarro de maconha a outro, for flagrado e o ato for equiparado a tráfico, é crime hediondo. Elevar o tempo de internação não é problema, mas estabelecer isso para crimes hediondos é uma impropriedade absoluta", conclui.
Professor Edgar Bom Jardim - PE

sexta-feira, 26 de maio de 2017

Ouvir professores, pais e até alunos foi fundamental para a Finlândia ter sucesso com sua nova base




Marjo Kyllönen, Secretária de Educação Básica de Helsinque (Divulgação)

“A escola já entrou na fase 3.0, pois a 2.0 ficou para trás.” É assim que Marjo Kyllönen, Secretária de Educação Básica de Helsinque, descreve o atual momento da Educação da Finlândia. O país virou referência na área, com a menor lacuna de aprendizagem entre o melhor e o pior aluno, segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), responsável pela avaliação do PISA.
Na escola do futuro finlandesa, os educadores dão foco em aprendizagem significativa e competências holísticas, os alunos têm participação ativa na aprendizagem e são incentivados a buscar caminhos individuais de estudo. Além disso, o ambiente escolar enfatiza as competências sociais e a colaboração. Sua renovação curricular foi iniciada a partir da escuta de vários públicos: educadores, pais, alunos e administradores do sistema.
Em São Paulo a convite da Conexia, empresa de soluções educacionais do Grupo SEB que faz parceria acadêmica com a Universidade de Helsinque, Marjo contou à NOVA ESCOLA sobre o trabalho envolvido nas discussões e na implementação de Base Nacional Curricular finlandesa.
Um grande desafio de se ter uma base curricular comum a todas as escolas é a implementação. Os Estados Unidos, por exemplo, têm enfrentado dificuldades nesse processo a ponto de uma das propostas da candidatura de Donald Trump era acabar com o Common Core. A que se deve o sucesso na implementação do currículo comum na Finlândia? 
O principal fator foi a coerência na preparação desse novo currículo, planejada e realizada envolvendo os atores locais no processo. Ou seja, incluiu dos professores de Educação Básica e de universidades, os administradores, como eu, os pais e também os alunos. O Ministério da Educação desenhou um mapa de percurso para a construção desse novo currículo. Nele apareciam marcos e datas, então todos sabiam o que aconteceria, quais as discussões, e houve tempo para responder questionários e reunir feedback. Foram organizados seminários para entender as necessidades das comunidades locais e a proposta foi publicada em uma rede aberta para sugestões e opiniões. Tivemos sucesso porque as pessoas que promoviam as mudanças foram incluídas no processo desde o início. 
Quanto tempo foi reservado para esse processo?
Em 2012 foram fixadas as novas regras para alocação de horas escolares e sugeridos os objetivos gerais da Educação Básica. A partir daí se iniciou um trabalho que durou dois anos. Primeiro, aconteceram discussões em nível nacional, mas Helsinque, por ser capital, iniciou ao mesmo tempo. No primeiro semestre de 2014 foram feitas as conversas nas diferentes regiões do país. Em lugares mais remotos, cidades próximas entre si formaram uma rede para discutir o assunto. Em seguida aconteceu a formação de professores, que é contínua. As novas práticas só foram implementadas no início do ano letivo de 2016, em agosto.
Qual foi a participação dos professores e da sociedade na construção do currículo?
Desde 2012 foram envolvidos professores, gestores, líderes, grupos de professores (eles não têm coordenadores, os educadores se reúnem em grupos colaborativos). Quando se discute o que precisava ser mudado, é muito importante entender os motivos pelos quais se promove a mudança. Se você não entende as razões dela, você pode até seguir ordens, mas o envolvimento é superficial. Acredito que o empoderamento e o envolvimento de todos são valores centrais da Educação finlandesa. Em Helsinque, por exemplo, um dos valores mais fortes é a participação dos cidadãos. Perguntamos aos pais quais deveriam ser os objetivos da nossa Educação e aos alunos coisas como “Como você aprende melhor?”, “Quais são os seus sonhos para a escola do futuro?” e “Como você enxerga a tecnologia?”. As ideias que eles deram podem ser vistas no nosso currículo. Um exemplo que me marcou nas discussões é que as crianças disseram: “nós queremos ter prazer em aprender”. E isso foi levado muito em consideração na construção curricular.  
“Quando se discute o que precisa ser mudado, é importante entender os motivos da mudança. Se você não entende as razões dela, pode até seguir ordens, mas o envolvimento é superficial”
Com o documento pronto, como aconteceu a implementação na prática?
Primeiro fizemos modelos e projetos-piloto. Buscamos escolas e professores que estavam prontos para fazer experiências. Quando eles provaram que a parte prática estava funcionando, abrimos aquelas escolas para que outros educadores pudessem visitá-las e tirar dúvidas. A um grupo de professores especialistas foi concedido tempo para desenvolver práticas pedagógicas, em times com objetivos comuns. Esses docentes tiveram um papel crucial junto aos colegas, pois criaram ferramentas práticas para o ensino, o que ajuda na mudança real no dia a dia escolar. Então eu digo que houve participação, modelos, colaboração entre colegas, uma boa dose de interação e discussão e só então se partiu para a implementação nas escolas.
Quais foram os maiores desafios e como eles foram solucionados?  
Mudança nas práticas de sala de aula são desafiadoras em qualquer país. É preciso atravessar a zona de conforto para fazer as coisas de um modo diferente. O professor estava acostumado a ter controle sobre o ensino e achava que tinha sobre a aprendizagem. Mas, na nova abordagem, o dono do processo de aprendizagem é o aluno, então o controle não está nas mãos do educador. Isso não que dizer que o professor tem menos importância, ao contrário, ele é o planejador desse processo. Para que ele seja bem sucedido, é preciso aumentar a colaboração entre docentes. A prática atual é a sala de aula invertida e a aprendizagem por projetos, que para alguns professores foi uma mudança natural, para outros, precisou de mais tempo para compreender como garantir que os alunos alcancem seus objetivos.  Outros obstáculos a ultrapassar são o contexto pedagógico e o ambiente para aprender. Foi preciso reconhecer o quanto o ambiente físico dita o modo como as interações acontecem entre as pessoas. Mudamos a disposição dos móveis e os espaços em que a aprendizagem acontece dentro e fora da escola para estimular a colaboração e realizar um trabalho mais holístico, interdisciplinar.
Qual é o impacto do currículo comum nos resultados educacionais da Finlândia?
Estamos no caminho de renovar a nossa educação por décadas. A primeira grande reforma já tem 40 anos e foi baseada na equidade. Queríamos que todas as crianças, de qualquer origem ou classe social, fossem para as mesmas escolas e isso demandou novas competências e ferramentas para os nossos professores. Precisamos de recursos para ajudar os alunos mais fracos. Isso estava na base da mudança e depois demos ênfase na importância das decisões tomadas localmente. Esse entendimento pedagógico nos levou onde estamos. Agora, durante a implementação do novo currículo, nós realmente acreditamos que ele vale a pena, pois levará os alunos ao próximo nível.
Na reformulação curricular da Finlândia, foram adotados processos de aprendizagem mais amplos, com mais enfoque em projetos interdisciplinares e mais autonomia dos professores. Qual o motivo dessas mudanças?

Uma pergunta que já respondi muitas outras vezes é: por que a mudança se vocês já alcançaram excelência? Nós entendemos que provavelmente tínhamos a melhor escola, mas essa escola era boa para o passado, não para o futuro. Temos orgulho do nosso sistema educacional, nós não vamos alterar a sua base, mas temos consciência de que se continuássemos no mesmo trilho, não iríamos preparar nossos jovens para o futuro. De algum modo, lá atrás, começamos a falar sobre o que precisaríamos para renovar as nossas escolas, então eu acredito que a atmosfera do país estava pronta para isso. A iniciativa de reforma curricular ganhou uma frase como norteadora: “Finland: A country where everyone loves to learn” (“Finlândia: um país onde todos amam aprender”) e acho que essa expressão traduz o que almejamos.
Fonte: Nova Escola.
Professor Edgar Bom Jardim - PE